Mês passado, Lula voltou de um périplo pela África
e Ásia, em busca de apoio oficial para disputar o prêmio Nobel da Paz. Faz
sentido. A África é um continente adequado para expor sua genialidade. Um
leitor de Veja se irrita. “Se instituíssem o Prêmio Nobel da Corrupção, com
certeza ele estaria entre os primeiros colocados”.
O leitor talvez nem tenha ideia da verdade que
está afirmando. O prêmio da Paz é o que mais acolhe vigaristas e corruptos.
Vamos lá: Luther King, Madre Teresa de Calcutá, Arafat. Lula quer sentir-se
entre seus pares, quando for receber o galardão em Oslo. Quem quer que conheça
a lista dos laureados com o Nobel da Paz sabe que Lula tem boas chances.
Mas Lula está ocupando a primeira página dos
jornais da semana não por suas nobres tentativas de oferecer ao Brasil seu
primeiro Nobel, mas por questões mais bem prosaicas. E bem previsíveis. Um
homem que não tem escrúpulos em comprar um Congresso, obviamente tampouco teria
escrúpulos em comprar mais uma mulher para seu uso. Neste sentido, deve estar
se espelhando em estadistas de escol, como Kennedy, Mitterrand, Clinton.
Descobriu-se o que há muito muitos políticos e jornalistas estavam sabendo: que
o homem dividia seu leito com mais uma dessas prostitutazinhas de palácio.
Não serei eu a condená-lo por essa humana
pretensão. Logo eu, que tanto curti as profissionais, e que jamais prometi
fidelidade à mulher nenhuma. Sei que há casais que se satisfazem um com o
outro. São raros, mas existem. Pessoalmente, nunca tive temperamento para a monogamia.
Isso é coisa de cristãos e sou ateu. Mas há abissais diferenças entre mim e o
Sumo Analfabeto. Por um lado, não sou analfabeto nem presidente da República.
Por outro, abomino a mentira e particularmente a mentira conjugal.
Anônimo cidadão posso me permitir tantas relações
quantas quiser e comportar-me como bem entender, desde que não infrinja lei
nenhuma. Este espaço é muito grande. Talvez eu tenha ferido a ética de muita
gente, mas ferir ética não é crime. Se alguém um dia me surpreendesse num
bordel, tanto faz como tanto fez. Aliás, os bordéis fizeram parte de minha
vida. Pena que não existam mais.
Já com um presidente da República é diferente, e
esta é uma das razões pelas quais eu jamais desejaria estar na pele de um
deles. Há uma coisa que se chama liturgia do cargo. Supõe-se que o primeiro
mandatário de uma nação seja um símbolo dessa nação, e símbolos não podem andar
galinhando por aí a torto e a direito. Tivesse eu a desgraça de ser presidente
da República, me manteria fiel - mais ou menos fiel, digamos – durante meu
mandato. E provavelmente sóbrio. Não se permite que um presidente ande tomando
porres pelos botecos da vida. Até Jânio Quadros era discreto neste sentido.
Quisesse eu curtir os prazeres de uma prostituta,
acho que colocaria o SNI a investigar sua vida pregressa pelo menos até a
primeira comunhão. Um homem de Estado não pode dividir sua cama com qualquer
piguancha. É uma questão até mesmo de segurança nacional. Uma vez na condição
de ex-presidente, eu voltaria serenamente a cair na gandaia. Isto é, se ainda
tivesse ganas. A idade nos torna mais seletiva.
Mais ainda. Fosse eu presidente, por mais
avançadinha que fosse minha mulher, ela também teria de entrar em recesso, pelo
menos por quatro anos. Não fica bem a um presidente ser cornificado. Um
presidente resiste à pecha de corrupto, ditatorial, desonesto. Mas não há
mandato que perdure para um corno. Depois do mandato, tudo bem. Quatro anos
passam rápido. Ainda sobra juventude para folgar.
Os jornais estão insistindo na infidelidade conjugal
de Lula e parecem querer intrigá-lo com Dona Marisa Letícia. Vã tentativa. Dona
Marisa já provou das delícias do Planalto e não será besta em mandar para a
panela a galinha de ovos de ouro. Certamente seguirá o sábio exemplo da
senadora Hillary Clinton. Relevará, e ainda passará por moderninha, mantendo
seus privilégios na planície.
Ao ser infiel à sua galega – como Lula a chamava –
o futuro Nobel da Paz está no fundo encarnando uma vocação nacional, a de trair
a própria mulher. As mulheres em geral sabem disso, mas não querem
incomodar-se. Desde que não seja em seus círculos de amizade, os maridos que
pulem a cerca à vontade.
Não, o problema não reside na infidelidade. O
problema é que Lula aliou-se a uma mulher com ambições de mando e de dinheiro.
E sem nenhum escrúpulo. Com a mesma conchalense com que o PT comprou
parlamentares, Dona Rose comprou favores para maridos e amigos, utilizando o
poder que a intimidade com Lula lhe conferia. No fundo, não bastasse o
contribuinte estar pagando o Aerolula e seus lençóis egípcios, a compra de
parlamentares e o êxito profissional de seu filho, está também pagando a vida
sexual do garanhão de Garanhuns.
Em Napoleão e as Mulheres, Guy Bretton conta um
episódio da vida do imperador. Napoleão, para aliviar-se das tensões da guerra,
mandou buscar a um acampamento uma de suas favoritas. A moça chegou e fez-se
anunciar. Com a objetividade de um general em campanha, Napoleão enviou-lhe uma
ordem:
- Que se vá despindo.
O tempo transcorria e o general não se fazia
presente ao bivouac da moça. Com frio, ela pediu à ordenança de Napoleão que o
lembrasse de sua presença. Napoleão, imerso em seu prazer predileto, a guerra,
deu nova ordem:
- Que se vá deitando.
E nada do general comparecer ao encontro.
Angustiada, a moça pediu novamente que a ordenança o lembrasse de sua presença.
Napoleão, qual estratego em batalha, foi curto e grosso:
- Que vá embora.
As leitoras que me perdoem, mas a meu ver este
deveria ser o comportamento de um presidente ante seus biscates. Frieza e
distância. Não se pode misturar vontade de poder com meros desejos sexuais. Em
algum momento, vai dar confusão. Ainda há pouco, dois generais nos Estados
Unidos perderam seus galões por confundir as duas vontades. Já que falei em
Jânio, volto a lembrá-lo. Certa vez, uma jornalista perguntou-lhe:
- Olá, Jânio. Que é que há de novo?
Jânio, que podia ser acusado de tudo, menos de
lerdo de pensamento, reagiu de bate-pronto:
- Esta nossa intimidade. Intimidade gera filhos e
aborrecimentos, duas coisas que não quero ter com você.
Se a intimidade com a Presidência não gerou
filhos, dos aborrecimentos o nobelizável não escapou. Quem nunca comeu melado,
quando come se lambuza. Estranho no ninho, Lula se esqueceu de tomar as
providências necessárias para preservar intacta sua máscara de honestidade.
Abomino a mentira conjugal, escrevi lá atrás.
Obviamente, Lula escondia a Outra da Perpétua. Tanto que as duas jamais
viajavam juntas em seus turismos ao Exterior. Nisto reside outro erro seu.
Provavelmente, o episódio terá desdobramentos que não ocorreriam se Dona Marisa
Letícia estivesse ciente das escapadelas do marido.
Mais ainda: Brasília é um prostíbulo a céu aberto.
Frequentado não por pobres meninas que giram bolsinha nas ruas. Mas por ancas
soberbas que ondulam nos corredores da Câmara e do Senado. É óbvio que o
garanhão de Garanhuns, dotado de tanto poder que se permitia até mesmo comprar
parlamentares, não terá sido insensível a tais tentações.
Ninguém se surpreenda se outras Roses surgirem.
Cristaldo é jornalista, escritor e
tradutor.
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